Área de Concentração: História Social da Amazônia

    

Linha de Pesquisa:

Arte, Cultura, Religião e Linguagens

Esta linha abarca estudos de história social e cultural de diferentes linguagens artísticas na Pan-Amazônia desde o período colonial ao tempo presente. O foco das pesquisas são as dimensões simbólicas e materiais das condições de produção sócio-históricas de diferentes linguagens, como artes visuais, musicais, cênicas, assim como a literatura em seus diferentes gêneros e em suas várias expressões. Em interação com esse enfoque, esta linha instaura marcante interlocução com os estudos da religião, em momentos diversos da história da Amazônia, entendidos aqui em seus contextos políticos e simbólicos da cultura, a partir de dimensões espaciais entre o local e o global. Um ponto fundamental, que estabelece os diálogos internos desta linha pesquisa, tem considerado as teorias, métodos, abordagens, testemunhos documentais e debates historiográficos da história social e cultural a partir de seu substrato simbólico nas interfaces com experiências de produção, circulação e recepção artística. Além do largo campo da "história social da arte e da cultura", construído ao longo do século XX, esta linha tem articulado estudos que instrumentalizam os debates em torno da "cultura visual" e de da "história visual", este aqui considerado como campo operacional de eleição de um ângulo estratégico de observação da sociedade. Em que pese os debates mais recentes, questões fundamentais das ciências humanas têm sido importantes para a história da arte, da cultura e da religião, especialmente no que concerne o tópico da "descolonização" das perspectivas analíticas da arte. Reitera-se que a América Latina e, em particular, a Amazônia tem sido um locus importante para argumentos, controvérsias e disputas políticas na historiografia contemporânea. Certamente esse aprofundamento teórico tem resultado em trabalhos fundamentais, produzidos nas duas ultimas décadas por docentes, pesquisadores e alunos do programa, que vão desde estudos sobre a pintura histórica de entresséculos no Brasil, passando por investigações sobre a imprensa, o rádio, o cinema, a televisão, o teatro e a música popular em áreas de fronteira, até pesquisas sobre trânsitos religiosos entre matrizes alóctones e locais nos últimos quatro séculos de história de encontros e confrontos de cultura. Categorias e conceitos-chave como "agência" dos objetos e das práticas artísticas (Alfred Gell), as interrelações nos "mundos da arte" (Howard Becker), as relações travadas no "mercado de bens simbólicos" (Pierre Bourdieu), as experiências de "comunidades de sentido" (Bronislaw Baczko), a potência, "sobrevivência" e memória das imagens (Aby Warburg e leitores), assim como das antinomias, das experiências individuais e coletivas na arte, das identidades e hegemonias discursivas na arte (p. ex: E. P. Thompson, Raymond Williams, Eric Hobsbawm, Stuart Hall) têm sido fundamentais na construção de projetos que manejam e ajustam diálogos internacionais na produção mais recente sobre a história da Amazônia sob o viso do testemunho artístico. Por fim, a linha tem valorizado a releitura do "cânone" e da obras clássicas do corpus artístico e literário da Amazônia, desde nomes sobejamente conhecidos como Raul Bopp, Mário de Andrade, Euclides da Cunha, Oswaldo Goeldi ou Theodoro Braga, até autores que ficaram restritos a uma cristalização "regional" porém com uma carga emblemática para historiografia, visualidade e literatura da Amazônia, como Dalcídio Jurandir, Bruno de Menezes, Eneida de Moraes ou mais recentemente Márcio Souza, Milton Hatoum ou Luiz Braga. Autores, documentos e obras que fazem parte de uma chave de leitura importante para a compreensão da sociedade amazônica, incluso, para além da semântica e de seus mitos de origem, seu vasto repertório cognitivo afro-indígena.

 

Linha de Pesquisa:

Cidade, Floresta e Sertão: cultura, trabalho e poder

A área se configura como coletivo de pesquisas em história da Cultura, Trabalho e Poder e se constitui como lugar de criação e debates sobre história e o fazer historiográfico em distintas temporalidades e espacialidades. Resulta da reflexão metodológica e historiográfica sobre os conceitos de cultura, ciência, sociedade, sociobiodiversidade, socioeconomia, trabalho, movimentos sociais e educação. A Cultura conceito amplo, engloba representações, ideias, mentalidades, maneiras de ser e sentir, ilumina a reflexão em que as relações econômicas e sociais se configuram como dimensões da história realizada. O pressuposto teórico dessa abordagem reside na afirmação de que toda a realidade se constitui social e culturalmente, promovendo a convergência entre a história da cultura da sociedade, em múltiplas dimensões como campo do conhecimento. A cultura elaborada e compartilhada por uma dada sociedade, possibilita a sociabilidade, confere inteligibilidade aos comportamentos humanos, permitindo que as ações sociais e suas representações sejam explicitadas e produzam narrativas inteligíveis. O uso de códigos, representações e símbolos para apreender e explicar o mundo, configuram-se como referentes a serem decifrados pelos historiadores, possibilitando examinar, de forma relacional, a realidade social, construída, desconstruída e reconfigurada, a partir das percepções dos vários grupos sociais. E torna admissível a emergência de mundos figurados e sublimados nas artes e na literatura, codificado pelos valores, pelo lugar do trabalho e do lazer, da educação e do ensino, na relação com o outro em distintos ambientes. Ressalta-se tratar de mundos pensados pelas elaborações intelectuais, explicado pela ciência e referenciado pelas técnicas, dotados de sentidos pelas realidades percebidas, crenças e sistemas religiosos ou profanos, pelos mitos e pela política. É legado pelas transmissões realizadas pela cultura, pelo ambiente físico e social e pela educação. A história sociocultural enquanto domínio múltiplo e diverso, fértil e vivo, abre-se à interdisciplinaridade, ao diálogo contínuo com as demais ciências, sem fugir à sua especificidade, indissociável das temporalidades e do lugar de pertinência, das permanências, mudanças e transformações, em que a explicação historiográfica adquire sentido. A cultura e sociedade, abordadas de forma relacional, permitem evidenciar a diversidade das relações socioeconômicas, políticas e ambientais, as experiências e ação de agentes históricos, passíveis de serem interpretadas pela história enfatizando os agentes e agências coletivas ou individuais. A cultura e a memória como dimensão e âmbito dos mundos simbólicos onde são elaboradas as experiências históricas e seus relatos, permitem compreender as maneiras como cada indivíduo e/ou sociedade registra e narra a sua história, abrangendo um conjunto de relações, estéticas, políticas, de apropriação de espaço urbano e rural/florestal. É na perspectiva cultural que o cotidiano e sua história se explicita ao inventariar as formas de vida e vivências, e propicia acesso as chaves explicativas de decodificação da cultura, à medida que confere significado e sentido à experiência diária, como dimensão do viver, ressaltando as experiências de vida não pertinentes ao normativo institucional, percebidas nas ‘entre falas’, apontando o provisório, as informalidades que desafiam as regras instituídas. Possibilita apreender as razões das decisões, elucidando o poder de malhas sociais tão eficientes quanto as estruturas oficialmente reconhecidas e visíveis na realidade. A linha possibilita pesquisas sobre cultura e sociedade na Amazônia-brasileira e conexões: socioeconomia regional e interações nacional e internacional; as relações gestadas por diferentes grupos em cidades, florestas e sertões nas Amazônias; experiências socioculturais, de educação e de ensino da história, de trabalho, poder, sociabilidades e conflitos; os impactos das políticas públicas; a história socioambiental.

 

Linha de Pesquisa: 

Etnicidade e Territorialidades: usos e representações

Dedica-se aos estudos sobre o processo de ocupação humana na Amazônia brasileira e, também, na Pan-Amazônia em um horizonte temporal amplo, desde o início da colonização europeia até o tempo presente. Discute conceitos, tradições historiográficas, abordagens teóricas e temas de estudo que problematizam o espaço na pesquisa histórica, partindo da premissa de que o território é construído socialmente ao longo do tempo. Nesse sentido, a linha explora abordagens que aproximam a análise histórica e a espacial, articulando temas como geopolítica, fronteiras, representação do espaço, lugares de memória, história ambiental, tropicalidade, geografias do conhecimento, história global, histórias conectadas e transnacionais. Discute, ainda, dinâmicas históricas e contemporâneas que se estabeleceram e se estabelecem em torno da mobilidade de diversas populações, da propriedade da terra, da organização do trabalho, dos fluxos comerciais, da evangelização e das trocas e mediações culturais, incluindo as científicas. São de particular interesse os estudos sobre o protagonismo indígena na exploração e no inventário do mundo natural, assim como nas práticas médicas, religiosas e econômicas, em associação ou não com empreendimentos coloniais em escala local, regional, transnacional ou global. Parte-se do pressuposto de que os povos indígenas ainda são eclipsados na historiografia em geral, embora sejam atualmente reconhecidos como agentes históricos, isto é, como sujeitos que possuíam e possuem uma agenda própria, que atuaram e atuam conforme suas percepções do universo que os cerca. A linha atua, portanto, para dar visibilidade a esses sujeitos, evitando que fiquem à sombra ou marginalizados na narrativa histórica. Além, da história indígena e do indigenismo, também a contribuição dos escravizados de origem africana na constituição da sociedade amazônica, a escravidão, o trabalho compulsório e as relações raciais e interétnicas constituem relevantes campos de pesquisa. A partir do instrumental teórico da história cultural e da história das ciências, aborda as representações do território e das populações locais, registradas ou materializadas em crônicas, relatos de viagem, relatórios, documentos governamentais, mapas, iconografia e coleções museológicas. Nesse aspecto, privilegia estudos voltados à produção, tradução, apropriação e disseminação de conhecimentos, identificando, no tempo, redes sociais e territórios por onde circulam conhecimentos e objetos, em fluxos de múltiplas direções. De maneira geral, a linha dialoga fortemente com disciplinas próximas à História, sobretudo, Antropologia, Arqueologia, Museologia e Geografia.

 

Linha de Pesquisa:

População, Família, Migração e Gênero.

Os estudos historiográficos sobre o que conhecemos hoje como Amazônia brasileira destacam ao longo do tempo as dificuldades e ações relacionadas ao processo de ocupação da região. Desde os primeiros missionários e colonos até o fluxo de imigrantes nordestinos e estrangeiros, a região se consolidou como área de destino de diferentes fluxos migratórios e heterogeneidade na composição da população local. Essa linha de pesquisa tem como foco central os estudos relacionados às dinâmicas populacionais, considerando seus aspectos demográficos, sociais, políticos, econômicos e culturais observados a partir dos marcadores sociais da diferença. Propõe-se a pensar a formação da população na Amazônia em diferentes deslocamentos e dinâmicas reprodutivas e afetivas discutindo as tensões, representações e experiências que marcaram essa dinâmica populacional e, em sua composição teórica, articula esse viés investigativo com conceitos/categorias como população, regimes demográficos, deslocamento, migração, família, gênero e os estudos "queer". Cronologicamente o espectro das pesquisas é amplo destacando: 1) a colonização brasileira e os impasses entre os povos indígenas, os colonizadores europeus e a migração forçada de africanos escravizados desde o século XVII, discutindo as epidemias, a mão de obra indígena, o trabalho de colonos e escravos, as políticas oficiais de formação, ocupação e domínio do território, as mulheres e a sexualidade nesse processo de colonização; 2) o desenvolvimento econômico centrado nas drogas do sertão, no cacau, na agricultura do nordeste paraense, na pecuária marajoara, na borracha e na industrialização de fábricas de bebidas, alimentos, castanha e madeira, e a relação com o movimento de população, as políticas oficiais de propaganda de atração de mão de obra nacional e estrangeira, os fluxos imigratórios europeus modernos, a chamada imigração de massa que ocorre após o ano de 1850, a sociabilidade e as redes sociais que nos ajudam a pensar o fluxo migratório, as trajetórias de vida e as análises prosopográficas; 3) a ocupação da terra e seu uso pela população, as ações do Estado e a legislação que regulamenta a posse de terras destacando o impacto na ocupação do território, do movimento e composição da população; 4) A História das mulheres e dos movimentos sociais trabalhistas e identitários no processo de formação e deslocamento da população na Amazônia, observando as lutas políticas, as trajetórias de vida, as redes de sociabilidade, as relações de violência e conflito, a casa, o trabalho e a cultura material; 5) Pensar o conjunto dos temas acima a partir da interseccionalidade, observando as questões de estamentos, classes sociais, raça e etnicidade, mas também, de gênero e sexualidade, a fim de pensar a dinâmica de formação da população, suas práticas e o discurso que ela encerra marcados pela construção assimétrica de poder entre os gêneros e a heteronormatividade.